Sem Sensibilidade: abril 2020

Estamos em isolamento devido a pandemia do covid 19 há um mês. As crianças não saem do apartamento há um mês.
Nunca imaginei algo assim. Estou falando de um apartamento pequeno, nada de quintal ou varanda. Temos uma sacada pequena e só.
Tem bastante área comum no condomínio, com parquinhos inclusive, mas as orientações de isolamento são bem claras.
O Dário é grupo de risco devido à cardiopatia. Não quero por tudo a perder de maneira alguma. Primeiramente tenho que proteger minha família. Estamos todos guardadinhos aqui.
Felizmente temos essa opção, nossa profissão permite trabalhar de casa. Tem sido bem pesado trabalhar com as crianças em casa, dar conta da casa e de toda rotina. Fazer comida, limpeza e tudo o mais. Estamos só eu, meu marido e as crianças. Cumprimos nossa carga diária de 8 horas de trabalho, cuidando das crianças, fazendo a limpeza da casa e cozinhando.
Ah, temos um gato também! Acho que ele não aguenta mais a gente aqui para ter o espaço só para ele. É super antipático.
Estamos nos reinventando para tudo, já achamos um caminho para fazer isso funcionar mas não há receita para sobrepujar o cansaço. A sobrecarga é grande e não dá para reduzir esforços.
Não dá para parar de trabalhar. Não dá para parar de cuidar das crianças. Não dá para parar de fazer comida, de limpar a casa. Não vamos ficar confinados num lugar pequeno e sujo! Não dá para fazer nada com relação ao espaço, mas a limpeza é essencial.
A regra aqui é clara, não vai virar bagunça de um dia para o outro para não dar chance de acumular as coisas e depois não conseguirmos mais organizar sem um grande esforço.
Doamos muitas coisas do apartamento para liberar espaço. Tudo que não é essencial foi embora.
De alguma forma muito inesperada estamos conseguindo manter as crianças felizes. As crianças estão felizes. Fico pensando se não é uma ilusão da minha cabeça, mas converso muito com meu marido e ele tem a mesma opinião.
As crianças estão felizes. Estamos juntos o tempo todo inventando muitas coisas. Atrapalha no trabalho, a produtividade caiu bastante durante o dia, mas as crianças estão felizes.
Isso me faz acreditar que pode continuar dando certo esse isolamento. Continuaremos fazendo as adaptações necessárias e tentando manter a cabeça no lugar mesmo sem perspectiva de quando o isolamento irá se encerrar. Ter a cabeça no lugar agora é praticamente questão de sobrevivência.
Estamos mantendo o ambiente leve e limpo para podermos ficar bem aqui. Não estou nem um pouco otimista que tudo isso vai acabar logo, mas não sofro por isso. Vamos vivendo um dia de cada vez.
As crianças precisam de pouco para ficarem bem. Só precisam de amor, atenção e um prato de feijão.
Brincadeiras à parte, mas acredito muito na importância do nosso tradicional feijão com arroz na alimentação. Por isso não abro mão de cozinhar.
Amo demais meus filhos. Demais mesmo.
Daqui alguns anos, quando tudo isso tiver acabado, quero olhar para o passado e me sentir confortável com as escolhas que fiz. Felizmente estamos conseguindo nos cuidar. Sei que muitas pessoas não têm essa opção, precisam sair às ruas para trabalhar. Por isso, me considero muito privilegiada e tenho que agradecer muito por isso e orar pelas pessoas que não podem estar como nós, em isolamento.
Espero que quando tudo isso acabar tenhamos nos tornado pessoas melhores, mais unidas e mais prontas a fazer o bem. Que tenhamos mais empatia.
Que as crianças tenham ótimas recordações desses dias em que ficamos confinados em um apartamento.
É uma situação bem extrema para todos, mas isso tudo vai acabar.
Minha família é a coisa mais preciosa que tenho. Já lutei muito por eles e vou continuar lutando e protegendo sempre.