domingo, 30 de agosto de 2015

1 mês internado

O que era para ser só uma consulta com uma cardiologista em São Paulo se estendeu em uma série de eventos inesperados.
Quando voltaremos para casa? Ninguém sabe. 
Dizem que os primeiros meses de vida determinam muita coisa no resto da vida de uma pessoa, fico pensando em como esse tempo no hospital vai influenciar na vida do Dário. 
Contando que ele tenha saúde o resto a gente dá um jeito.
Ontem a saturação dele chegou a 90 e eu fiquei olhando o aparelho super feliz e torcendo para não ser erro de leitura. Mas ele ficou estável nessa faixa. O que será que está acontecendo? O tubo desobstruiu? Não seria um sonho?
O cirurgião do lábio disse que a cirurgia foi liberada pelo convênio e que pode ser adiada por até uma semana. 
Podia acontecer um milagre e tudo dar certo para que ele opere o lábio mesmo. Seria ótimo. 
Estou otimista que muitas coisas boas acontecerão. Muitas coisas boas tem acontecido mas o longo tempo no hospital me ofusca. Preciso focar nas coisas boas para não ficar maluca.


Banheira cor de rosa?





sábado, 29 de agosto de 2015

Dormindo a noite toda

As últimas noites foram sem cólicas, então ele tem dormido bastante. Dorme por volta das 11 da noite e acorda por volta das 5 da manhã.
Aquela cólica infernal que ele estava tendo era por causa do fm85. Esse fm85 estava fazendo ele ganhar mais peso mas com um custo alto. Ele não merece sentir cólica e chorar daquele jeito. Quando engatava no choro iam cerca de 20 minutos chorando forte e ininterruptamente.
A médica pediu para voltar a ligar o oxigênio quando ele estiver dormindo. O oxigênio está saindo pelo tubo da imagem abaixo, o que está perto da boca dele, enrolado num pano.
Ele ainda está com a sonda no nariz, então ele recebe leite por ela a noite sem acordar. Eu só dou mamadeira se ele estiver acordado.
Pelo menos a noite ele descansa bem. Durante o dia eu fico de guarda tentando aliviar a carga de estresse que ele recebe.


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Muito leite

De 8 mamadeiras de 90ml eu consigo que 6 sejam do meu leite. É o melhor que consigo.
As outras duas são de alfaré.
Dessa forma ele não teve mais cólicas e o côco voltou a ser molinho e clarinho.
A redução da medicação também influencia nisso. Principalmente a retirada do antibiótico.
Ele está como se nada estivesse acontecendo. Igual quando ele internou para ser operado. Todos falando que ele estava correndo risco de vida e ele dando risada para todos.
Agora a saturação dele está boa. Não está tão baixa como quando ele operou. Está ficando na casa dos 80.
A cardiologista veio falar que dá dó de cancelar a cirurgia do lábio porque a saturação está super estável. Depois ela falou que vai repetir o eco do coração na terça para bater o martelo sobre isso.
É que no eco dessa semana não conseguiram ver a CIA dele. A cardiologista não sabe se o médico esqueceu de olhar ou se ela fechou.
O babaca estava tão focado em mostrar o blalock fechado para todos os residentes que não olhou tudo o que tinha que olhar. Depois ainda falou que não conseguiu porque o Dário estava agitado.
Agitado o escambau. Eles tiveram todo tempo necessário para fazer tudo e mais um pouco. Só que ficaram desperdiçando esse tempo primeiro com duas residentes que não conseguiram fazer nada e depois com um médico que quis dar uma aula para todos os outros sobre um blalock obstruído.
O eco de terça vai ser bem diferente. Não vão passar o Dário pela mão de residente nenhum, o menino já está super desgastado de todo esse tempo que ficou aqui.
Eles podem muito bem pegar a gravação do eco e mostrar para os residentes depois. Não precisam ficar nos expondo a todo desgaste da realização desse exame. Ainda mais se for para ter um bando de toscos fazendo exclamações assustadoras sobre o coração dele.
Se a questão é que esses resistentes precisam aprender algo, eles que usem essas gravações e nos poupem desse desgaste. O Dário é um bebê que não entende isso e está cansado de tanta manipulação.
Falei tudo isso para a cardiologista. Que o médico não viu a CIA porque não quis.
Hoje eu estava conversando com o cirurgião do lábio. Ele disse que se der certo a quinta já está reservada para o Dário. Só depende dos cardiologistas liberarem mesmo. Estávamos conversando daí uma enfermeira nos cortou dizendo que ele não vai poder operar por causa da intercorrência.
Quase perguntei para ela se ela virou cardiologista.
Eu estou estressada. Quando estou estressada posso exagerar em tudo o que faço, vejo e escrevo. Mas escrever me ajuda a ponderar um pouco minhas atitudes. Bem pouco.
Hoje eu estava tomando banho quando escutei o Dário chorando bem alto. Sai correndo do banheiro e tinha uma médica no quarto mexendo nele. É a primeira vez que isso acontece. Peguei ele no colo para tentar acalmá-lo.
Ela disse que só queria ver como ele estava e eu só conseguia pensar em como ele estava melhor antes dela chegar.
Quando ele se acalmou fui me vestir, estava só enrolada numa toalha.
Ele é muito bonzinho, nunca fica chorando, muito pelo contrário. Está sempre quieto olhando para tudo, sorrindo para alguém ou tentando enfiar a mão toda na boca.
Deve ter muita gente que confia cegamente nos outros para cuidar de seus filhos mas eu não. Mesmo ela sendo uma médica eu só consegui pensar que ela havia machucado ele.
O que será que ele vai achar disso tudo? Exagero? Espero que não.




quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Saturação estável

Nossa história não é melhor que a das outras mães que estão aqui. Tem muitas histórias e todas elas são cheias de ensinamentos.
A única coisa que temos certeza é que não podemos ter certeza de nada. Tem sempre tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que nunca se sabe o que pode não sair conforme o esperado. Muita coisa pode dar errado sempre e eu não acho errado não nos preparamos para isso. 
Ele fez uma cirurgia super invasiva e arriscada. Muita coisa poderia dar acontecer. 
"O tubo está obstruído mas a saturação dele está mais estável que quando ele não tinha essa obstrução."
Quem explica isso? Mas o que vão fazer agora? 
A equipe cardiológica ainda não decidiu. Vão refazer o blalock? Tentar fazer a definitiva? Não vão fazer nada e esperar para ver o que acontece? Vão deixar operar o lábio? 
Não me falaram nada ainda. Foi um dia como se nada estivesse acontecendo.
Foi um dia tão tranqüilo, sem exames, com a saturação alta e a mãe do Felipe aqui que até sai do hospital. 
O Dário estava precisando de roupas. Aproveitei que estamos em São Paulo e fui no Brás. Fui e voltei em menos de duas horas. Comprei bastante roupinhas para ele. A mãe do Felipe levou para lavar e passar. 
Eu olho para esse mocinho sorrindo para mim e fico feliz porque ele não entende. 
Ontem a enfermeira entrou no quarto para fazer os controles, a saturação dele estava em 80. Depois ela foi ver a pressão e eu usei o aparelho para ver minha saturação. Estava 98.
Queria tanto ser cardiopata. Tipo descobrir que eu tenho o mesmo coração que ele e nunca precisei de nada. Mas todos os médicos falam que é impossível isso.
Agora ele recebe duas doses de clexane por dia. São duas injeções nas pernas. Dói. Fica roxo. Ele chora. Mas disseram que é um anticoagulante.
"Às vezes o sangue coagula no tubo e obstrui."
Daí já imaginei os coágulos saindo pelo corpo entupindo vias importantes. A médica disse que se o coágulo sair não tem problema porque ele vai para o pulmão. 
Será que isso pode acontecer e o tubo desobstruir? Isso sim seria um milagre. 
Eu não tinha noção de como tudo seria, só lembro da médica dizendo que seria um transtorno. 
Será que é isso mesmo, um transtorno?
Não é isso não, isso é assumir todos os compromissos e riscos da maternidade. 
O Dário sempre nos presenteia com um sorriso lindo. O Dário é um doce de bebê. 

Medindo a saturação do Dário




Blalock fechado

Ontem eu estava escrevendo algo sobre um dia tranqüilo com uma noite bem dormida, um Dário risonho e sem cólicas e lindas e frequentes ordenhas generoras.
Quando foi 5 da tarde vieram nos levar para fazer o eco do coração.
Quem começou a fazer o exame foi uma médica que não sabia nem usar o aparelho direito. Ela não estava conseguindo achar nada no coração do Dário. Ela saiu e trouxe mais uma.
"Ai meu Deus, o que é isso aqui?"
"Não sei, vamos chamar o doutor."
Muito animador ouvir as duas conversando. Mas antes de irem chamar esse outro ainda ficaram um bom tempo nessa falta de bom senso. Ficaram olhando o coração dele como quem assistia a um filme de terror. Esqueceram que tinha alí um bebê chorando e uma mãe assustada.
Por que não terminar a droga do exame logo? Em vez disso ficaram nos usando como se fôssemos atração de circo.
Trouxeram um tal de Gustavo Favaro. Esse eu lembro bem do nome porque foi outro idiota que deu continuação a toda estupidez que estavam fazendo. Será que acham que estavam nos fazendo um bem?
Por que não deixaram toda a conversa tosca para depois?
De repente ainda entrou outra no quarto para colocar mais entusiasmo na conversa.
Como se não estivéssemos ali.
O blalock do Dário fechou. É como se ele não tivesse sido operado. Aliás, ele tem um tubo fechado dentro do peito. Tem um corte no peito. Tem várias sequelas de uma cirurgia perdida.
O médico tosco vira e fala tudo isso como quem diz bom dia.
A cirurgia do lábio foi suspensa. A equipe cardiológica está decidindo o que farão. Ainda bem que o Felipe estava aqui comigo.

Fisioterapia de ontem



terça-feira, 25 de agosto de 2015

Leite podre

Esse é mais um capítulo da história do leite. Antes de chegar no ponto do leite são 3 da manhã de hoje, eu estou dormindo no sofá e o Dário no berço. A enfermeira entrou para fazer os controles e viu que a saturação dele estava em torno de 60%.
Ela ligou o oxigênio para ver se subia. Dei a mamadeira para ele, fui no lactário fazer uma ordenha, voltei para o quarto. Ele teve uma cólica do capeta, chorou demais, fez um monte de côco e ficou tão suado que achei melhor dar um banho nele para relaxar e ajudar a aliviar a dor.
Mas esse ainda não é o ponto do leite podre.
De manhã a cardiologista veio vê-lo e pediu dois exames para investigar a saturação baixa. Ela pediu um eco do coração e um eletro encéfalo.
O eletro encéfalo estava marcado para hoje, não tinha horário certo, sabiam que seria entre 3:30 e 5:30 da tarde. Ele teria que ser sedado e, por causa disso, não mamária às 3 da tarde.
Foi assim que ele recebeu a mamada do meio dia e ficou sem mamar até às 18 horas. Só que ele recebe parte do leite na mamadeira e parte do leite na sonda.
Quando veio a sonda das 18 tinha o resto do leite de meio dia no tubo da sonda.
"Moça, não tem que tirar isso daí não?"
"Ah, deixa eu perguntar qual a validade desse leite."
Duvido que ela beberia um copo de leite que ficou 6 horas fora da geladeira. O pior foi que ela ainda saiu para confirmar se precisava tirar mesmo.
Ela voltou e lavou a sonda, depois colocou o leite nela. Ou seja, além dele não ter mamado às 3 da tarde, na mamada das 6 ele perdeu 20ml de leite que ficou na sonda. Essa mamada tinha que ter vindo com esses 20ml.
Sobre o eletro encéfalo, a sedação não pegou então eu tive que fazê-lo dormir e o exame foi feito com ele no meu colo. Fiquei 30 minutos sem me mexer para que ele não acordasse e perdêssemos todo o exame. Deu tudo certo e o exame deu normal.
Para fazer esse exame tiveram que colocar 23 eletrodos na cabeça dele. Como ele é muito cabeludo eles ficaram escorregando.

Indo fazer o exame sem sair do berço 


Com os eletrodos na cabeça 


No local do exame tem uma cadeira de lavar cabelo para tirar a cola que usam nos eletrodos 



segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Caldo de feijão

Ele tem tido cólica toda madrugada. Não consigo acreditar que ele estaria tendo se tivesse permanecido só com leite materno, já que em casa não tinha mais cólicas.
"Ou é o alfaré, ou o fm85 ou algum remédio que ele está tomando."
"Você está comendo muito feijão?"
"Mas eu sempre como feijão e ele não tinha cólica."
"Mesmo assim, vou pedir para mandar só o caldo de feijão para você.'
Eu nem sabia que ela era nutricionista de nós dois. Mas faz sentido ela se preocupar com o que estou comendo.
Quando chegou o almoço eu achei engraçado o caldo de feijão separado.


Ela também tirou o fm85 do meu leite e eu estou tentando ordenhar o máximo possível para ele não ter que tomar alfaré.
Hoje ele começou a ter crise de cólica às 4 da manhã, justo no horário combinado para eu ir no lactário.
É que a noite não tem lactarista lá, então vai uma outra pessoa abrir só para eu ordenhar.
Ele chorava tanto mas se eu não fosse tirar o leite a próxima mamada seria de fórmula. Deixei ele com a enfermeira e fui com a intenção de tirar o leite de duas mamadas para não ter que sair do quarto de novo.
Desci as escadas correndo até o lactário. Minha meta era de 200ml.
Se está prescrito 60ml na sonda e eu só consigo ordenhar 55ml a lactarista não vai colocar 55ml de leite materno na sonda e 5ml de fórmula porque eles não misturam o leite. Ou é um ou outro.
Com 200ml eu estaria coberta para as mamadas das 6 e das 9 horas.
Em 15 minutos eu ordenhei 180ml. Em 15 minutos eu ordenhei 20ml.
A cada gota dos 20ml que saia eu lembrava da enfermeira jogando 20ml do meu leite fora.
Hoje até a mulher do elevador já ouviu essa minha história do leite. Ainda estou indignada.
"Você fala tanto, mas tanto do leite, que eu sonhei que eu tinha quadrigêmeos e eles começavam a chorar ao mesmo tempo querendo peito!"
Ela disse que acordou assutada no meio da noite por causa desse pesadelo.
"Como eu daria o peito para 4 bebês se eu só tenho 2 peitos?"
Como eu dou leite para meu bebê se ele não pega o peito e eu estou sozinha num hospital e tenho que ir correndo até o lactário para fazer ordenha?
Eu queria que ele tomasse só meu leite para vir imunologicamente fortalecido para a cirurgia do coração e não pegasse nenhum tipo de infecção. No final das contas ele pegou infecção.
O triste é que quase todos os bebês pegam. Tomara que ele não pegue de novo na próxima cirurgia.
Tomara que a hora que eu cruzar de novo com a enfermeira que jogou meu leite fora eu já tenha superado o drama dessa madrugada.
Quando voltei do lactário ele ainda estava chorando de cólica. Estava no colo da enfermeira que tentava acalmá-lo.
Se eu tivesse ficado não teria tido melhor resultado que o dela. O melhor que fiz para ele foi ter ido no lactário mesmo.


24 de agosto

"Mãezinha, vou ter que jogar 20ml do seu leite fora."
"Se você soubesse o tanto que é difícil tirar 20ml."

É claro que ela ficou sem graça. Eu me sentiria cometendo o pior dos pecados se tivesse que jogar 20ml do leite se alguém fora. É muito difícil produzir e ordenhar leite.
Para receber o leite na sonda eles pegam o leite que eu ordenhei e colocam num frasco. Desse frasco sai um tubinho que vai para dentro da barriga do Dário. Não pode entrar ar nesse tubinho e ele pode ser usado por 24 horas. 
Todos os dias às 9 da manhã elas trocam esse tubinho. Dentro dele cabe 20ml de leite, então o frasco das 9 vem com 20ml a mais de leite para ficar no tubo e o Dário receber o valor da dieta que a médica prescreveu. Ou seja, pela sonda ele deve receber 60ml, como às 9 da manhã vão trocar o material da sonda, o frasco de leite vai vir com 80ml para que não fique ar no tubo para a "mamada" do meio dia. 
Ao meio dia vão vir 60ml de leite que vão passar pelo mesmo tubo que já tem 20ml de leite dentro. O Dário vai receber esses 20ml das 9 horas mais 40ml do meio dia. 
Ontem, na mamada das 18 horas a enfermeira veio com uma conversa que tinha ar no tubo, daí ela pediu para vir 20ml a mais de novo no frasco. Eu quis estrangulá-la.
"Você não tem noção da raiva que estou sentindo por te ver fazendo isso."
Tinha uma bolha de ar no tubo que não ia matar o Dário. O que mata o Dário são as cólicas que ele está tendo por causa do alfaré. Demorou mas elas vieram. Se não for pelo alfaré deve ser pelo tal do fm85 que estão colocando no meu leite.
Também perde muito do meu leite na transferência de um frasco para outro, eu tiro na bomba, passo para uma mamadeira e depois eles ainda passam para outro recipiente.
Ainda tem o leite descartado na mamadeira que o Dário não mamaou inteira.
Vou pedir para a nutricionista tirar o tal do fm85 do meu leite para ver se as cólicas passam. Não aguento mais ver esse menino chorando de dor.
O Dário precisa engordar. Quanto mais gordinho e mais bochechudo mais a fenda fica fechadinha. Quando eles fizerem a correção a pele não vai ficar tão esticada com risco de romper. Isso porque a fenda dele é bem aberta.
Quando a fenda é bilateral ela abre mais rápido, por isso que eles corrigem mais cedo. A do Dário não foi corrigida logo por causa da cardiopatia.
Conforme ele cresce com a fenda aberta a parte inferior do lábio cresce normal mas as partes separadas do lábio superior não, porque a fenda vai abrindo. Quando eles fizerem a correção a parte superior do lábio vai ser menor. O médico disse que com o tempo elas vão se igualando em tamanho.
Hoje é dia 24 de agosto. Teoricamente eu engravidei por volta desse dia. No ano passada a data da minha última menstruação foi 10 de agosto. É como se o Dário existisse há um ano. Mas nós só descobrimos ele em setembro.


Sala de ordenha com 3 vagas






domingo, 23 de agosto de 2015

Como não chorar?

"A gente não vai poder ouvir o choro desse menino."
"Por que?"
"Para não estragar a cirurgia. Se chorar abre tudo os pontos. Vai ter que ficar com ele no colo."

Faz todo sentido isso. Tomara que nada dê errado, que ele não fique chorando de dor, nem de cólica.
Ninguém perguntou para ele se ele quer ficar com a boca assim mas acho que ele iria preferir operar porque não é só estética, é qualidade de vida. Pelo menos foi o que a fono disse.
Eles vão fechar o lábio e o palato mole. O palato duro fica para mais para frente.
A fenda do palato dele é completa, até o "sininho" da garganta é dividido no meio. Eles vão corrigir isso também. Nunca consegui tirar uma foto de dentro da boca dele. Sempre que falo que é assim as pessoas ficam surpresas porque é meio estranho imaginar isso.
Hoje eu abri a porta do quarto e uma menina veio correndo na minha direção. Sempre tem crianças brincando no corredor. Levei um susto porque pensei que ela estivesse usando um batom bem roxo. A avó estava com ela.
"Oi mocinha! Ainda não tinha te visto aqui!"
Ela saiu correndo sorrindo.
A avó perguntou se o meu bebê também é coração. Também. Daí raciocinei que a menina não estava usando batom.
Fiquei pensando nela saindo correndo cianótica daquele jeito. Sempre pensei que seria impossível isso. Mas ela foi correndo pelo corredor.
Ela tem dois anos e veio para fazer a última cirurgia. Terceira ou quarta cirurgia, como disse a avó.
O Dário nunca ficou cianótico daquele jeito e os médicos faziam tanto terrorismo comigo.
A pessoa tem que ter muita cabeça para não enlouquecer. Eu acho que não tenho, fico com medo de enlouquecer. Fico muito tempo sozinha no quarto com ele.
Eu tinha medo de ter depressão pós parto e isso tudo sempre foi um prato cheio para ter. Mas também nem deu tempo de pensar em depressão. Tempo de enlouquecer deu de sobra.

"Se você perceber que estou ficando louca você me fala?"
Porque todas as enfermeiras falam que as mães não aguentam ficar aqui sozinha.
"Antes podia andar lá fora, depois proibiram porque tinha mãe que estava indo no shopping com o filho."
Não acreditei quando me disseram isso.
"Por que você não vai em um médico para te receitar uns calmantes?"
Porque esse remédio da pressão sozinho não está sendo o suficiente. É só passar um pouco mais de apuro que ela sobe de novo e vem mais cirurgias pela frente. Mais apuros.
De repente eu até consigo uma consulta aqui para não ter que sair de perto dele.
E se eu tivesse nascido assim, como ele, como meus pais teriam cuidado de mim? Ainda bem que podemos cuidar do Dário. Ele está recebendo o melhor tratamento nesse hospital.
Quem vai ter que ter uma cabeça muito boa para conviver com tudo isso é o Dário. Espero que a gente consiga dar todo suporte necessário na sua formação. Tenho certeza que não vai faltar amor.
Serão mais 10 dias até operar o lábio e depois duas semanas para ir para casa.

"Olha que bonitinho!"
Daí eu olho para o Dário e ele só está olhando para a mão dele como se fosse a coisa mais espetacular do mundo.
Mais sensacional que ver que ele descobriu as mãos é ver que o Felipe tem essa sensibilidade de notar isso.

"Dário, viu só como a mamãe soube escolher um excelente papai para você?"

sábado, 22 de agosto de 2015

Ordenhando de madrugada

Parecia uma zumbi atravessando o hospital de madrugada para ir até o lactário. Não eram nem 3 da manhã e o leite materno estocado havia acabado.
Eu estava com a cara amassada, despenteada e de pijama. Mas quase ninguém viu. Mas também, se verem, qual o problema? Essa é a menor das minhas preocupações. Minha preocupação é garantir o leite dele. Tirei 120ml.
Ele está com materno exclusivo na mamadeira, então vão me chamar para ir lá ordenhar quando o estoque acabar. Na sonda ele recebe alfaré ou materno, se tiver muito estocado.
O lactário funciona das 8 da manhã às 8 da noite, mas abriram essa excessão para mim porque ele estava tendo muita reação às fórmulas. Muita cólica.
O Felipe saiu ontem de Campinas depois das 8 da noite. Chegou aqui no hospital pouco depois das 10. Ele estava meio febril, tinha passado a semana inteira meio resfriado, por isso não tinha vindo antes.
Deve ser ruim ficar lá em casa sozinho, ainda mais doente.
Se eu fosse contar tudo o que acontece aqui! Acho que eu não registro nem metade. É muita coisa a cada dia.
Ontem repetiram todos os exames de sangue para garantir que nada atrapalhe a correção do lábio. Fiquei torcendo para dar tudo certo e deu. A única coisa que deu alterado foi o potássio um pouco acima do normal, mas isso não é grave como seria se ele estivesse com uma infecção.
Agora é garantir que tudo permaneça estável e ele continue ganhando peso para corrigir o lábio.



sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Alfaré

Alfaré é um leite de proteína hidrolisada. Leites assim são bem mais caros mas são de mais fácil digestão, então dão menos reações nos bebês. Eles são bem caros por causa disso.
Sempre que ouvia alfaré eu entendia alfahair e ficava pensando: "que raio de leite de nome de produto de cabelo?"
O Dário estava com rejeição total ao NAN sem lactose. Mesmo depois que tiraram o TCM, aquele aditivo que tinham colocado. Essa noite foi outro filme de terror com ele chorando de dor.
Eles não gostam de dar o alfaré porque o gosto é ruim, mas o Dário ainda está com a sonda na boca. Ele não sente o sabor de nada que passa pela sonda. Como o peso dele ainda não está bom a sonda está sendo mantida.
Agora o alfaré está na dieta dele. Passam 60ml a cada mamada pela sonda. O meu leite vem na mamadeira e ele mama o tanto que quiser. Isso porque só estou conseguindo tirar em torno de 400 a 500 ml de leite materno por dia. Para quem tirava mais de um litro isso é bem triste. 
O dia correu tranqüilo assim, mas o menino está exausto por não ter dormido a noite. Foi um pesadelo essa noite, não conseguimos dormir mesmo por causa das cólicas.
A equipe plástica e cardiológica estão bem sincronizadas com os preparos para a correção da fissura labial. Essa será a primeira cirurgia de várias. Não dá para saber quantas serão ao todo porque esse número pode variar em função da resposta dele ao trabalho fonoaudiológico. Ele precisa desenvolver e fortalecer a musculatura bem, se isso acontecer vai ser muito bom.
O palato não é fechado agora porque ele ainda está se desenvolvendo. Se eles fecharem eles podem bloquear esse desenvolvimento que pode ser muito útil. 
Os bebês que nascem assim e tem só o lábio fechado não costumam ter problema de deglutição por conta do palato aberto mesmo após a inclusão dos sólidos nas refeições.
Após essa cirurgia, se o bebê só tem a fissura, ele já vai para casa no dia seguinte. O Dário vai ficar em observação na UTI cardiológica, por precaução. 
Todo essa estrutura do beneficência portuguesa de São Paulo é fantástica. Todos os cardiopatas fissurados podem ser tratados aqui com excelência.
E era sobre isso que eu estava conversando com um dos cirurgiões hoje. Há um percentual considerável de bebês que nascem com essa combinação de malformações congênitas, eles chamam de alterações da linha média e pode abranger outras parte do corpo que estão na linha média dele.
"Ah, então você já corrigiu a fissura de um cardiopata?"
"Não."
Isso porque cardiopatas fissurados primeiro vão tratar o coração e a equipe cardiológica daqui não estava sincronizada com a de correções faciais. Agora que a cardiológica se deu conta que a outra existe e é muito boa.
Eles corrigem em média de dois fissurados por semana. Achei um volume alto. Não são só correções de fissuras que eles fazem mas todo tipo de cirurgia de crânio e face. 
Eles possuem bagagem de experiência considerável. Me senti mais segura por isso também. Muita gente vai me condenar por abrir mão do Centrinho mas tem muitas variáveis nessa história.
A equipe daqui é completa e abrange várias áreas. Eu estava preocupada com a parte dentária e ele me explicou que eles também fazem esse acompanhamento com o ortodontista. Disse que o Dário vai ter que usar aparelho nos dentes.
Isso eu já tinha deduzido também. A gengiva dele é aberta no meio, vão ter que corrigir isso e posicionar os dentes que nascerão bem errados. 
Essa equipe é da Vera Cardim, ela é super renomada. 
O Dário está tendo a oportunidade de se tratar num lugar excelente e completo.
A única coisa ruim aqui é que no quarto dos bebês só tem berço para eles, não tem uma cama para as mães, só um sofá e uma poltrona. Acho que tinha que ter uma cama porque a mãe é obrigada a ficar aqui. O bebê não pode ficar sozinho, precisa de um acompanhante que sempre é a mãe. Mas dá para dormir bem no sofá. 
Foi tirar o PICC da perna dele que nós dois passamos a dormir juntos no sofá. Antes eu tinha medo. As enfermeiras entram no quarto e o berço está vazio, daí elas levam um susto.
"Mãe, cadê o bebê?"
"Vixe, sumiu?"
É tão pequenininho encolhido do meu lado que nem dá para ver. Uma gracinha. Tem que aproveitar bem enquanto é pequeno.
Não consigo imaginar como ele vai ficar após a cirurgia. O médico disse que não vai ficar perfeito, que sempre vão olhar para ele e ver que ele nasceu com a fenda. Contando que ele continuei lindo, para mim não tem problema. 
E ele é lindo mesmo. Ele fica deitadinho do meu lado dormindo e eu olhando para ele. Coisa mais fofa. 

Eu estava relutante em colocar uma foto minha aqui porque mais de 20 dias presa num hospital é bem diferente do que ficar num salão de beleza mas ele ficou muito lindo na foto abaixo, mesmo com as meias nas mãos


Próxima cirurgia

Hoje vieram conversar comigo sobre a cirurgia do lábio.
A princípio, está programada para o dia 03/09/2015. Tomara que tudo continue indo bem até lá, que o Dário continuei bem.
Acho que não teremos problemas para o plano liberar a cirurgia porque o médico estava dizendo que não é estética não. Se fosse poderia ter problema.
Estou me sentindo mais aliviada apesar de todo cansaço desses dias no hospital.


quinta-feira, 20 de agosto de 2015

O mistério do leite desaparecido

Eu alertei que o Dário estava recusando a mamadeira mas só deram atenção quando perceberam que o peso estava caindo de verdade.
Nessa hora começaram a atirar para todo lado, fizeram vários exames procurando alguma alteração e tentaram mudar a dieta dele.
Essa parte da dieta é delicada. Se ele fosse um dos bebês que nasceu e nunca saiu do hospital talvez a mãe não gritasse tanto. 
"Em casa ele mamava mais de um litro de leite materno todo dia e ganhava cerca de 300 gramas por semana"
Perdi as contas de quantas vezes repeti isso. 
Frente a isso eles perdem o posto de detentores de todo conhecimento sobre meu bebê. Ele é meu e eu o conheço muito bem porque ele foi para casa e eu cuidei muito bem dele.
Por isso que essa parte da alimentação é delicada, porque eu vou falar, vou gritar e vou xingar se me sentir contrariada e tudo isso eu faço muito bem.
Ele estava em casa tomando só leite materno. Depois viemos para o hospital para sua cirurgia cardíaca e as coisas caminharam bem até eu começar a ficar com a pressão alta. Minha cabeça estava a mil por hora com todas as novidades e incertezas da UTI.
De repente ele precisou de complemento. Vieram com o tal do NAN sem lactose e eu triste por ter que alimentá-lo com isso. Também estava receosa de gerar qualquer tipo de desconforto devido a cólicas num bebê que já estava sofrendo demais com a cirurgia. 
Mas deu certo. Talvez porque intercalamos as mamadas de leite materno e NAN. Nunca duas de NAN seguidas, de materno sim.
Depois ele começou a recusar o leite e a perder peso. Quando vi o leite estava vindo com mucilon. Me senti traída. 
Por que não me perguntaram se podia dar esse lixo para ele? 
Farinha e açúcar para um bebê de 3 meses? Querem engordar o menino as pressas com farinha? E o valor nutricional do alimento, não importa? E se ele tiver cólicas? Daí enche o menino de Tylenol? Até que ponto compensa engordar o menino com farinha?
Insistiram em tirar o mucilon e colocar TCM.
"Mãe, é só um oleozinho para fazer ganhar peso. É um óleo bom"
A nutricionista fala isso e fala que colocava azeite na mamadeira do filho dela.
Certo. 
Opa, esqueci de contar algo. Ontem de manhã o Dário recebeu a visita de um médico da equipe da doutora Vera Cardim. Ela é uma cirurgiã plástica que faz aqui no Beneficência Portuguesa a correção de lábio leporino e fenda palatina, dentre outras coisas. Ele veio falar que a correção do Dário pode ser feita aqui e queriam saber se eu aceito fazer. 
Eu sei que o Centrinho de Bauru e a Sobrapar de Campinas são referência em cirurgias assim. Até mesmo porque lá tem todo o suporte de todas as especialidades envolvidas no tratamento que é complexo. Eu não abriria mão de levá-lo num desses lugares se ele não fosse cardiopata. 
A sobrapar não tem suporte de UTI cardiológica, então ele nunca poderia operar lá, a menos que algum cardiologista escreva uma carta falando que isso não é necessário e nenhum cardiologista vai dizer isso.
O Centrinho tem mais estrutura só que eles são bem cautelosos sobre fazer a correção facial de cardiopatas. Não tiro a razão deles. Eles esperam que seja feita toda correção cardiológica para mexer na face. 
Surgiu outra questão sobre o Centrinho, vários médicos estão dizendo que eles estão com falta de cardiologistas lá. 
Se o Dário fizer a correção do lábio no mesmo lugar que está fazendo a correção do coração talvez as coisas fluam mais porque os médicos já estão todos juntos. Não vou precisar ficar levando cartinha de um médico para outro e aqui no beneficência portuguesa eu não tenho dúvidas que tem o melhor suporte cardiológico do Brasil. Espero que ele não seja necessário, mas é bom saber que ele está disponível e acessível. 
Então, quando a nutricionista veio me perguntar sobre colocar TCM no leite eu pensei que estavam já pensando no peso que ele perdeu sendo um empecilho para corrigir o lábio antes de receber alta. 
"Eu preciso confiar em alguém para não ficar louca. Você daria isso para seu filho mesmo?"
Foi assim que o NAN começou a vir com TCM. Mas eu fui no lactário e tirei bastante leite para garantir que não fossem todas as mamadas da noite com NAN. Vai que ele não reagisse bem com esse aditivo.
Veio a primeira mamadeira com TCM às 18 horas. Depois as mamadeiras das 21, 0, 3 e 6 também foram de NAN com TCM. 
O que fizeram com o leite que eu havia ordenhado? Ele serviria para duas mamadas! Eu não acreditei. Toda mamada que chegava eu olhava no rótulo com ódio. 
Como o leite tem duração de 12 horas, depois disso eles jogam fora, então teriam que jogar o leite fora! 
Como era noite ninguém soube me responder o que estava acontecendo. Tive que esperar 8 horas. 
O pior de tudo é que esse TCM deu muito reação. O Dário chorava ininterruptamente de cólica. Se não fosse TCM em todas as mamadas, se tivessem intercalado com meu leite, talvez a aceitação fosse melhor. 
Quando foi 8 da manhã eu liguei no lactário e ninguém sabia me responder o que havia acontecido.
"Tem que perguntar para a equipe da noite."
Depois me disseram que tudo que elas sabiam era o que estava no mapa: NAN com TCM e materno com fm85.
"Hein?? Que raio de fm85 é isso?"
Eu fiquei louca. Mas o leite tinha desaparecido mesmo, então esse fm85 nem entrou de verdade na história. Mas como o lactário recebe um mapa com a dieta do meu filho sem passar por mim? Eu preciso saber o que estão dando para ele!
Na minha cabeça eu só conseguia pensar que estavam jogando meu leite fora porque ele não faria o Dário engordar o suficiente para deixar de ser um problema.
Estava procurando a nutricionista, ela que tinha colocado aditivo no leite materno. 
Depois ela explicou que quando ela estava indo embora que ela soube que tinha fm85 e pediu para colocar no leite materno. Depois não tinha dado tempo dela voltar para conversar comigo. 
Fui pesquisar sobre esse negócio e algumas pessoas me disseram que ele é bom. Que cardiopatas precisam de mais cuidado para ganhar peso porque eles vão ter mais dificuldade e tem a questão da cirurgia do lábio. 
A nutricionista tirou o TCM e manteve o fm85. Uma coisa de cada vez, não é? Ele só tomava leite materno! Agora querem mudar tudo de uma vez, fora o tanto de remédios que já teve que tomar! Um monte de sabores estranhos causando reações diversas no seu corpinho.
A tarde fui no lactário ordenhar e quem me atendeu foi a mesma moça da ordenha do leite desaparecido.
"Moça, que fim deu meu leite?"
"Não sei."
"Acho que alguém bebeu."
Ela riu.
"Ou, daqui uns dias, vocês vão achar um queijo humano perdido".
Fiquei fazendo ordenha. De repente apareceram duas funcionárias e me chamaram. 
" Você desculpa a gente, mas seu leite caiu, nós ficamos tão tristes porque a gente sabe o tanto que é difícil tirar o leite, mas ele estava na mesa e eu fui virar e bati o braço. A gente ficou pensando se te ligava na hora mas já era noite e a gente achou melhor esperar você vir aqui para te contar."
Elas pediram desculpa várias vezes.
Elas também estavam com medo da chefe que poderia ser avisada do desaparecimento do leite. 
Acidentes acontecem mas não é todo mundo que entende. 
Não adianta chorar o leite derramado mesmo. Se caiu já era.
Aqui eles tem uma fiscalização tremenda em tudo, é um funcionário dedurando qualquer deslize do outro. Por isso que tudo é muito bom, eles querem ser perfeitos.
"Vocês não falaram para ninguém o que aconteceu?"
"Não."
"Ok, vou falar que vocês acharam sujeira do leite e tiveram que jogar fora. Que vocês não me ligaram ontem porque já estava tarde e que vocês estavam esperando eu vir aqui para me falar." 
Foi o que eu fiz. Ah, foi uma mentira boa. Se é que isso existe.
Depois voltei lá para fazer ordenha de novo.
"Trouxe essa caixa de bombom para vocês pararem de jogar meu leite fora!"
Elas riram. Tenho que tratar bem quem cuida do leite do Dário, não é? 
E elas são as pessoas que mais conversam comigo aqui. Eu estou ficando maluca presa aqui. 
"Dário, mentir é feio."

O TCM é a camada de gordura boiando no frasco da sonda


Leite materno com fm85


Dormindo e recebendo leite pela sonda







quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Meias nas mãos

Com a sonda na boca ele tem que ficar de luvas. Sem as luvas o bebê tira a sonda.
Na falta de luvas vão meias mesmo.
Esse menino fica lindo de qualquer jeito e, apesar de tudo, está sempre sorrindo.






Mucilon de arroz

Ele está com fome, muita fome. Mas quando a mamadeira é ofertada ele começa a mamar com muita voracidade e, logo depois, começa a chorar e não mama mais.
O que será? 
Vieram dois médicos achando que era infecção de ouvido. Ficaram olhando dentro do ouvido do moleque. Não acharam nada e continuaram insistindo nisso. Depois alguém lembrou de olhar dentro da boca dele e acharam uma ferida. 
Agora a ferida já foi tratada, então o que está acontecendo que o comportamento se mantém?
Fizeram exames de sangue, exame se urina, raio x do tórax e eco do coração. Tudo normal. Daí resolveram repetir tudo de novo e de novo. É tão fácil fazer esses exames aqui. Só não percebem que para ele esses exames não são nem um pouco divertidos. 
Depois alguém viu que o cara que faz a coleta de sangue não usa agulha de bebê. Será que é por isso que as veias dele estão tão judiadas? Puxa, que mistério! Um milhão de exames com uma agulha de adulto. O menino continua sem mamar e já deve ter perdido um litro de sangue para exames. 
A cardiologista vira e fala que vai mandar uma fono para avalia-lo. Oba! Quem sabe ela não consegue algo para fechar a fenda aqui? Eu não iria importar nem um pouco! Várias vezes reclamei que havia me tornado correio de médicos, levando dúvidas e cartinhas de um para outro! Se pudesse corrigir o coração e o lábio num lugar só seria ótimo porque eles convesariam entre eles.
Daí entra a fono no quarto.
"Quanto ele mama antes de parar de mamar?"
"Uns 20ml."
"Então a gente engrossa esses 20ml com mucilon."
Não, péra, volta tudo do começo!
"Como assim, o que importa é a consistência e não o volume?"
"Mas o leite materno já não é completo?"
"Ele está se hidratando ingerindo só 20ml de leite a cada mamada?"
"Mucilon para um bebê de 3 meses?"
"Você não está querendo resolver só o problema do peso sem investigar a causa da negação da mamada?"
"Você é burra ou o que?"
Daí ela ficou sem graça e disse que vai voltar amanhã para avaliar melhor.
Ela não colocou a mão no Dário!
"Você dá mucilon para ele e resolve o problema do peso rapidinho, dai eu vou para casa com uma bomba explodindo de cólica! Não quero correr o risco de gerar mais desconforto para ele."
Ela foi embora e veio a enfermeira passar a sonda. Não é nada legal isso, mas agora ele vai se alimentar. Chorou um monte, ficou fazendo ânsia de vômito com a sonda e depois estava ok até virem tirar mais sangue. Furaram duas vezes para tirar os 15ml.
Coitado, quanta coisa numa tarde só! Depois falam que ele é bravo sendo que ele está sofrendo tudo isso já tem quase um mês.
De repente chegou o leite. Eram 30ml na mamadeira e 50ml para a sonda. A parte da mamadeira é porque o bebê sente necessidade se sugar e sentir sabor, então a médica deixou uma parte separada.
Estava dando o leite na mamadeira e também tinha leite correndo pela sonda.
Foi então que veio a cereja do bolo do dia.
Olhei no frasco de leite que estava alimentando a sonda e o que estava escrito lá?
"Mucilon de Arroz"
Chamei a enfermeira. Perguntei quem tinha alterado a dieta dele e pedi para interromper o que estava correndo na sonda.
Quem tinha alterado era a cardiologista de manhã. Toda a conversa com a fono foi super desnecessária porque a cardiologista já tinha alterado a dieta dele.
Fiquei tão, mas tão brava! Me senti como se estivessem me fazendo de idiota, de palhaça, como se estivessem passando por cima de mim, fazendo as coisas pelas minhas costas.
"Por que ela não me falou? Eu preciso saber sobre toda conduta dela! Não tenho que descobrir as coisas dessa forma!"
"Querem engordar o menino com farinha para se verem livre do problema do peso mas ninguém sabe por que ele não está mamando!"
"Traga uma fono de verdade para avaliá-lo, não aquela fono de araque!"
Daí eu estava com ele nos braços chorando e gritando um monte de coisas por causa de um mucilon.
Por causa de um mucilon? Ou por causa dos exames de sangue, da sonda, da fono, do leite que não consegui ordenhar no horário, dos dias que estamos aqui, de todo estresse e cansaço?
"Rapaz, vamos combinar o seguinte: uma hora a mamãe vai falar para você fechar os olhos e tapar os ouvidos e você vai ter que obedecer sem questionar."
Acho que estou ficando louca e acho que logo vou explodir de verdade.
Se eu pudesse fazer ordenha no quarto! Mas todo o leite tem que ser ordenhado no lactário se não for para dar o peito. Eu não posso ordenhar no quarto porque não tem como esterilizar os materiais nele.
Mucilon não tem valor nutricional nenhum. É cheio de açúcar. Engorda o bebê com farinha e pode gerar vários problemas no futuro, como obesidade e diabetes.

Procurando veia para tirar sangue. Olha a cara dele como se estivesse suplicando para que eu o tire dali...



Passando leite pela sonda. Sem mucilon



terça-feira, 18 de agosto de 2015

Leite na seringa

Nem lembro mais desde quando estou dando leite na seringa para ele. Eu contei isso aqui?
Não, eu contei que ele tinha pegado o peito! Como as coisas viram do avesso assim de uma hora para outra?
Mas é isso mesmo, acontecem mil e uma coisas por dia.
Agora cada mamadeira é ofertada a cada 1ml, em uma seringa. Ou seja, se a mamadeira tem 80ml e ele mama 3 vezes a noite eu atravesso a noite colocando leite assim na boca dele.
E o leite, é materno? Isso é inacreditável!
"Moça, você olha ele para eu ir no lactário?"
Daí eu desço correndo 4 lances de escada, corro por um zigue zague de corredores, entro na sala, coloco touca, lavo as mãos, coloco máscara, pego a bomba, ordenho o leite o mais rápido possível, coloco o leite no frasco, rotulo ele, coloco na geladeira e volto correndo para o quarto.
O elevador sempre demora demais.
Faço tudo isso em 20 minutos. E a enfermeira ficou olhando o Dário. Na maioria das vezes eu faço ele dormir e quando eu volto ele nem acordou, mas já aconteceu de ele acordar.
Se eu for com calma vou demorar e, da próxima vez, ela não vai querer olhar o Dário para mim.
"Moça, você olha ele para eu ir no lactário?"
"Tem que ser agora?"
Duas horas depois e eu ainda estava esperando ela. Chorando, é claro. Era para a mamadeira que veio às 9 ser com meu leite, mas eu não fui lá tirar e veio o tal do NAN. Estou aqui com os peitos explodindo de leite e dando esse NAN para ele.
Por que ele só está tomando leite na seringa? Só ele sabe. Mas, agora não vai ter mais jeito, tem que passar a sonda. O leite vai direto para o estômago.
"Rapaz, você ficou sem opção agora. É mamar ou mamar. Se bem que isso não é bem mamar."
Eu tive que deixar 6 mamadeiras no lactário porque as que eles tem lá não é desse bico que ele consegue pegar. Agora nem faz diferença mais.
Por que ele está perdendo tanto peso? Por que estão dando tantos remédios para ele?






segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Sem cateter

A cicatrização está ótima. A saturação estabilizou em 85.
Tirou o cateter da perna porque não está recebendo mais antibióticos. Quando a enfermeira veio tirar eu assustei porque pensei que teria que sedar.
"É só puxar"
Tão simples! Mas eu não imaginei que seriam 23cm de fio dentro dele.
"Vai até perto do coração."
Por isso que sedaram para colocar. Ficaram das 15 às 20 horas para colocar esse negócio nele.
Agora não tem mais aquele treco pendurado na perninha! Dava tanto medo quando ia pega-lo no colo, e se algo enroscasse ali!


O bom também é que não vão entrar no quarto toda hora para mexer nele para colocar o antibiótico que ficava correndo no fio por cerca de uma hora.
Ele vai sair daqui bem diferente de como entrou. Eu sou super ignorante sobre todas as coisas que aconteceram aqui mas tenho que acreditar que todas foram necessárias para que ele sobreviva.
Ele entrou aqui bem. Estava em casa se desenvolvendo super bem. Vai sair daqui com vários dias de atraso de desenvolvimento, cicatrizes no peito, uma cirurgia cardíaca e uma infinidade de exames realizados. Só de raio x foram vários e isso significa exposição à radiação.
Um monte de coisas que os médicos disseram que eram necessárias. Ah, também tem os remédios. São vários.
Para mim, que sou ignorante, ele estava super bem em casa. Veio aqui para sofrer. Todo dia eu fiquei remoendo isso na minha cabeça.
O que será que vai acontecer agora? Nós vamos para casa, e daí? Será que eu devo ficar me preocupando com isso? Será que eu devo me preocupar se a próxima cirurgia será pior?
Não adianta sofrer por antecipação e eu preciso estar bem para cuidar dele.



Fazendo pose




Doar sangue


Por conta da cirurgia cardíaca o Dário perdeu um pouco de sangue que teve que ser reposto.
O sangue que ele recebeu foi retirado do banco de sangue do hospital, então eles pedem para que os familiares e amigos do paciente reponham ele. 
Eu não posso porque estou amamentando, mas o Felipe pode e foi lá nesse final de semana.
Doar sangue é algo que deveria fazer parte das nossas a vidas.


Ontem eu estava no lactário e encontrei uma mãe nova. Começamos a conversar e ela tinha acabado de chegar da Bahia. O bebê tem 4 dias, eles descobriram a cardiopatia depois que ele nasceu e vieram de carro para cá porque não tem como tratar lá.
Quando ela falou que estava fazendo o tratamento particular eu arregalei os olhos porque aqui nesse hospital tudo é muito caro. Ela disse que eles tiveram que deixar um cheque de R$30.000,00 na recepção, só que, dependendo do tempo que o bebê ficar internado o valor pode ficar várias vezes isso porque só o valor da diária na UTI é muito alto.
Alguns bebês precisam fazer duas cirurgias seguidas, isso também vai fazer o custo subir demais.
Quando cheguei aqui descobri que tem muita gente que entra pelo SUS. Todas as pessoas que conversei que entraram pelo SUS vieram de longe como do Piauí, Maranhão ou Mato Grosso. Para entrar aqui elas precisaram de uma ordem judicial.
Aqui é o melhor lugar para o tratamento de cardiopatia congênita. Não tem cardiopatia que chega aqui que eles não viram antes. Eles possuem muita habilidade e conhecimento. E o hospital tem uma estrutura impecável. Tem muito lugar que está longe de ter o mínimo de tudo isso, por isso que essas pessoas vem de longe, porque elas tem o direito de serem tratadas.
Todas as mães falaram para a mãe da Bahia procurar um advogado e se informar. Porque é direito dela. A mãe que veio do Mato Grosso teve até a hospedagem do hotel paga pelo governo e o hotel que ela ficou é muito melhor que o que eu paguei para ficar nos dias que o Dário esteve na UTI.
Tudo isso porque elas não tinham opção de tratamento pelo SUS nas suas cidades. Esses bebês morreriam lá.
As mães que descobriram na gravidez já vieram ter os bebês aqui no beneficência portuguesa.
O Dário teve sorte que a cardiopatia dele pode esperar para cirurgia, tem muitas cardiopatias que precisam de intervenção imediata. Te muita mãe que sonha com o dia que vai poder pegar o filho no colo e ele já tem mais de mês. Ele nasceu e já foi direto para a UTI.
Eu não sei como a mãe da Bahia entrou no lactário e tirou 150ml de leite. Isso é dom para ser mãe.


sábado, 15 de agosto de 2015

Otite?

De repente o Dário começou a fazer greve de fome. Qualquer pessoa mais esperta teria feito ligação com algo que aconteceu uns dias atrás, só eu que não.
Minha cabeça está péssima por causa desses dias aqui no hospital. Nunca mais dormi direito mesmo. Sempre que eu consigo fazê-lo dormir entra alguém no quarto para mexer nele, daí ele acorda e começa tudo de novo e é assim dia e noite.
Tudo virou uma loucura e, se eu estou um trapo de tão cansada, ele então está pior. Porque ele que foi esperado, cortado, costurado, medicado, sedado, revirado, resfriado, cutucado, serrado e muito mais.
Ele perdeu muito peso em pouco tempo. Ontem a noite estava no limite da desidratação por não mamar. Eu insistia para que ele mamasse e nada. Estava entrando em pânico porque qualquer coisa errada só adia a alta do hospital.
Ficou duas horas recebendo soro e isso rendeu 200 gramas a mais na balança hoje.
O médico virou o Dário do lado do avesso tentando descobrir o motivo da perda de apetite e nada. Fez vários exames de sangue, o que também foi outro filme de terror.
Não tem mais veia que dê para tirar sangue dele. Todo o corpo já está muito machucado. A enfermeira ficou muito tempo tentando encontrar uma veia, tentou uma na mão mas não deu certo. Foi para a outra mão e coletou o sangue mas deu amostra insuficiente. Tiveram que mandar outra pessoa para procurar outra veia e tirar mais sangue.
Tudo isso com o Dário chorando desesperadamente e eu ficando louca do lado.
Mas todos os exames deram normais. Então identificaram que não tem mais infecção. Mas resolveram que precisavam ver a urina.
Como coleta urina de bebê? Colaram um saquinho que deve ser desprezado se o bebê não fizer xixi em meia hora. Se ele não funcionasse teria que passar a sonda de novo.
Fiquei torcendo para dar certo, óbvio. O primeiro saquinho se perdeu quando ele fez côco. O segundo saquinho perdeu a validade de meia hora sem ele fazer xixi.
"Vamos chamar a enfermeira para passar a sonda."
Mas daí já era noite. A enfermeira veio de madrugada. O guri dormindo um sono gostoso.
"Não dá para ser depois?"
Na manhã do dia seguinte vieram com outro saquinho. Meia.hora depois e nada. Ele não estava mamando, faz sentido não fazer xixi.
Outro saquinho.
"Rapaz, vou te deixar pelado mas é para te poupar de um sofrimento de verdade."
Ele sempre faz xixi quando está pelado e sente um friozinho.
E assim saíram 7ml do xixi do meu filhote. Ufa! Que alívio! Nada de sonda no pipi dele. Duvido que vai dar alguma alteração.
O médico veio e ficou olhando o ouvido dele.
Se ele está com fome e começa a mamar mas depois chora e interrompe a mamada é porque está com dor de ouvido. Mas estava tudo normal dentro do ouvido do moleque.
"Ah, pode ser porque vai ficar ruim."
"Mas tem como ele ter alguma infecção de ouvido tomando tudo isso de antibiótico?"
"Pode ser algo que o antibiótico não pegou."
Daí ele saiu e foi ligar para a médica do Dário.
Ela foi mais sensata. Tirou todos os antibióticos já que não tem mais infecção de nada e já deu a dose mínima. Deixou observando se vai brotar mesmo uma infecção de ouvido.
Tudo vira culpa da fenda. Sempre usam a fenda como justificativa para tuso. Dessa vez disseram que ela facilita ter otite porque pode vazar leite no canal do ouvido e ficar acumulado lá favorecendo a proliferação de bactérias.
Tudo isso de manhã.
No final da tarde eu viro para o Felipe e perguntou se eu contei para ele que o Dário machucou a boca com a unha...
"Bruna, é por causa disso que ele não está mamando!"
Ele machucou no local em que deveria ter o palato. É uma região bem sensível e totalmente exposta. Eu não raciocinei nem um pouco sobre isso.
Peguei uma seringa e fiquei dando leite para ele nela, de meio em meio ml. Demorou, mas ele está tomando tudo assim.
A fono disse que isso é bem comum em bebês com fendas, tem que cuidar bem das unhas e o Dário entrou na fase oral muito cedo.
Felizmente agora minha pressão está ok e eu vou conseguir cuidar melhor do Dário. Ainda bem que o Felipe veio passar o final de semana
"Dário, sua mãe está muito longe de ser uma mãe perfeita."





De quem o Dário herdou todo esse cabelo?






sexta-feira, 14 de agosto de 2015

100 dias de vida


Hoje o Dário completa 100 dias de vida. Desses 100 dias ele já esteve 30 internado.
Todo dia aqui no beneficência portuguesa ele recebe uma visita da cardiologista, da fisioterapeuta, da nutricionista e da enfermeira. A enfermeira olha todos os pontos, curativos e cortes.
Por isso que aqui é muito bom. Eles tem muito cuidado com os pacientes. Chega a ser em excesso.
Ontem eu estava dormindo no sofá e veio a assistente social no quarto. Eu estava super sonolenta, não lembro de nada do que ela disse. Só lembro que eu queria que ela fosse embora logo porque ela falava muito alto e estava quase acordando o Dário.
Hoje repetiram o exame de sangue para ver se a infecção está controlada. Hoje completa a dose mínima do antibiótico, se estiver tudo certo já podem interromper a medicação e tirar o PICC da perna dele.
Minha pressão está super controlada, só tenho sentido um pouco de dor de cabeça mas pode nem ser por conta da pressão. Pode ser qualquer coisa.
A mãe do Felipe veio duas vezes nessa semana para passar o dia comigo. Ela tem ido quase todo dia lá em casa também para ver se o Felipe precisa de algo. Deve ser bem chato para ele ter que ficar lá sozinho sem a gente e não é sempre que ele consegue vir passar a noite em São Paulo porque ele está trabalhando em Campinas e o trânsito é muito ruim até o hospital.
O Dário está perdendo muito peso. A médica disse que é por causa do diurético. Por que ele precisa disso? Eu não sei. Não sei de tanta coisa. Por que dão remédio para pressão para ele? Também não sei.
Sem saber eu já quase explodo. Quase fico louca. Se eu fosse tentar entender tudo eu já teria ficado louca de verdade.

"Tem sangue na língua dele!"
Quando vi o sangue fiquei desesperada achando que alguém tinha entrado no quarto e enfiado algo na boca dele. Estou ficando paranóica porque toda hora entra alguém no quarto e não é sempre que eu vejo. Tem horas que estou tão cansada que durmo um sono muito pesado.
Eu tinha ido no lactário e deixado ele dormindo, quando voltei ele estava no colo da enfermeira.
"Você saiu e ele acordou."
Quando peguei ele do colo dela e vi o sangue eu fiquei furiosa. Fiquei perguntando o que ela tinha feito, depois fiquei perguntando se outra pessoa tinha mexido nele.
"Só a enfermeira do curativo entrou no quarto."
Depois que raciocinei, ele tem enfiado a mão na boca. Fica o tempo todo fazendo isso. Como ele estava com as unhas grandes ele mesmo se machucou.
"Você precisa confiar na gente."
Preciso mesmo. Preciso confiar nas pessoas e ficar mais calma.


quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Duas semanas internado

Aconteceram tantas coisas nessas duas semanas!
Dizem que nossa percepção de tempo é alterada conforme acontecem coisas novas na nossa vida. Que se numa janela de tempo aconteceram muitas coisas novas e diferentes teremos a sensação que essa janela de tempo foi bem maior do que de fato foi porque nosso cérebro registra as diferenças. 
Parece que tem anos que estamos aqui. São anos e o Dário mantém o mesmo peso. 
Eu queria tanto vir com ele para o quarto e agora tenho a impressão que estou ficando louca no quarto. Podia ter uma área para podermos sair para tomar um sol e ver o tempo. Mas é tudo fechado e a janela não abre direito. Dá para ver só uma brecha de uma avenida super movimentada. É tanto trânsito que nem dá para deixar a janela aberta por causa do barulho também.
Quando foi a última vez que sai lá fora? No ano passado? É essa a sensação. 
Hoje eu dormi junto com ele. Se ele dormia eu dormia também. Fiquei mais entediada e cansada. 
Saímos no corredor da pediatria. Tinha uma menininha de 5 anos na porta. Ela veio para fazer a quarta cirurgia do coração.
"Posso colocar a mão nele?"
Mas ela só olhou e saiu.
Voltamos para o quarto. Decidi sair de novo no corredor e tinha um menino de dois anos. 
"Por que esse mocinho lindo veio parar aqui?"
"Tumor"
Acho que vou parar de perguntar. Parte o coração ver essas criancinhas aqui. A menininha tinha saído da terceira cirurgia com movimentos em só um braço porque teve uma parada cardíaca. Hoje ela anda com dificuldades mas é uma vitória em vista de como estava antes. 
Crianças se recuperam muito bem.
"Dário, nós vamos embora logo, mas um dia a mamãe vai ter que te trazer aqui de novo."


quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Groselha

Num dia ele ganhou 90 gramas e no outro perdeu 50. O dia que ele perdeu 50 foi o dia que não dei as mamadeiras porque dormi em virtude de todos os calmantes que me deram.
Também não pude ordenhar nesse dia por conta de toda medicação. Disseram que sairia no leite. Talvez ele tenha ficado com cólica porque só tomou fórmula.
O bumbum dele está bem assado. A dor incomoda e isso pode fazer perder o apetite também. Disseram que os antibióticos fazem o côco ficar mais ácido e assa mesmo o bumbum. Estou enchendo de pomada para aliviar a dor.
A médica pediu um eco do coração. Foi o primeiro exame que ele teve que sair do quarto para fazer. Todos os aparelhos vinham até ele.
O bebê só pode sair do quarto com a mãe. De repente vi uma moça chegando com uma cadeira de rodas no quarto.
É protocolo do hospital, eu tinha que ir junto mas tinha que ser na cadeira de rodas. O Dário estava dormindo profundamente no meu colo.
Quando chegamos na sala do exame ela estava tão gelada que eu assustei. 
A médica pediu para tirar a roupa do Dário e coloca-lo na maca.
"Não pode fazer no meu colo? Ele vai acordar se mexer."
A resposta foi não. Eu coloquei ele na maca e ela falou para deixar para tirar a roupa depois então, para ele não acordar. 
Mas não adiantou nada, ele acordou. Estava todo acolhido e aquecido no meu colo, é óbvio que iria acordar na maca. Também porque a médica saiu da sala e só voltou uns 15 minutos depois que eu havia colocado ele na maca. 
Ele começou a chorar e a se mexer. A médica começou a reclamar que não estava conseguindo fazer o eco. 
"Vou pegar groselha."
"Hein???"
Mas ela saiu. Deve ter descido até o inferno para buscar a groselha porque demorou demais e deixou nós dois na sala gelada. Como se eu fosse dar groselha para ele que só toma leite. 
Voltou com o copo de groselha na mão. 
Fiquei falando que ele só toma leite.
"Mas é só um açúcar."
Exatamente por isso eu não quero que dê para ele. Ele só tem 3 meses!
"Vou chamar a doutora."
Acho que ela foi buscar essa doutora no inferno também, porque demorou demais.
Voltou ela e mais duas médicas. Peguei o Dário no colo e ele continuou chorando.
"Nos países desenvolvidos os bebês são sedados para esse exame."
Se ela tivesse o mínimo de bom senso teria feito o exame com ele no meu colo porque depois ele dormiu no meu colo e ela terminou o exame sem problemas. 
"Ah, ele é bravo! Eu lembro dele, quando ele chegou fomos fazer o eco e tivemos que sedar."
"Quando ele chegou ele estava bravo porque ficou 6 horas no PS sem mamar. Em vez de sedar você devia ter experimentado dar uma mamadeira."
Ele não é bravo, ele é um bebê normal. Bebês querem se sentir protegidos e acolhidos. Bebês querem colo. Não querem ficar numa maca em uma sala gelada com alguém passando um aparelho com gel gelado no peito deles. 
E outra, quem me garante que o peito não está sensível por causa da cirurgia? Estão insistindo para eu não vira-lo de bruços e nem de lado por três meses!
Eu sei que o exame era necessário mas parece que falta bom senso. Ele é um bebê e eu sou uma mãe que não aguenta mais essa falta de bom senso. Bebê é bebê.

Sala do eco do coração 









terça-feira, 11 de agosto de 2015

Sono

Acordei 8:30. O café da manhã e a mamadeira do Dário já estavam no quarto. O Dário já estava recebendo o antibiótico.
"Quantas pessoas entraram aqui e eu não vi?"
Logo percebi que eu estava pior que ontem, mesmo com o remédio da pressão.
Nem fui no lactário, avisei na recepção que eu teria que ir no pronto socorro e pedi para as enfermeiras olharem o Dário. Ele estava dormindo.
Não estava enxergando coisa com coisa, tudo parecia quebrado. Minha cabeça parecia que ia explodir. Comecei a chorar de raiva e medo.
"Por que eu tenho que ficar assim?"
Não queria deixar o Dário sozinho. Avisei o Felipe e pedi para ele vir porque eu não queria e nem podia deixar o Dário sozinho. Eles pedem pelo menos um acompanhante, mas recomendam mesmo que sejam dois para revesarem.
Cheguei no pronto socorro e peguei uma senha, depois me chamaram para o cadastro, depois para triagem, depois para consulta. Na consulta a médica pediu exame de sangue e passou alguns remédios para tomar na hora.
Da consulta já me chamaram para fazer o exame de sangue e depois para receber a medicação. Entrei na sala de medicação e, quando sentei na cadeira, entrou uma mulher me chamado.
"Estão te chamando lá na pediatria porque você deixou se bebê lá sozinho chorando!"
Todos olharam torto para mim. A sala estava cheia. Eu já estava chorando sem parar por ter que deixar o Dário e ela chega e fala isso na frente de todos assim.
Sério, só tinham pessoas finas e bem arrumadas lá, eu era a única com chinelo de dedo, roupas simples e sem as unhas feitas. Todas as mulheres de cabelos brilhosos, macios e tratados e o meu não estava nem penteado. Fora isso eu não conseguia parar de chorar desde a chora que deixei o quarto.
Sai da sala de medicação, tinha tomado só um comprimido e ainda faltavam os remédios na veia. Fui correndo para a pediatria. Quando cheguei a enfermeira perguntou se eu estava bem. Expliquei que eu ia receber medicação mas que tinham falado para eu voltar na pediatria.
"Não filha, vai lá se tratar, de criança aqui a gente cuida muito bem, só não sabemos cuidar de adultos."
De repente pararam de me chamar de mãezinha para me chamar de filha.
Quando entrei na sala de medicação de novo perguntaram por que eu tinha voltado.
"Vocês me fizeram passar vergonha! Falaram na frente de todos que eu tinha deixado meu filho sozinho e chorando para eu vir aqui. As pessoas devem ter pensando: que raio de mãe é essa que sai do lado do filho internado?"
Depois continuei falando: "Cheguei lá na pediatria e ele estava dormindo. As enfermeiras disseram para eu vir aqui despreocupada porque lá eles cuidam muito bem de crianças."
Todo pessoal da sala ficou me olhando. Depois comecei a chorar e expliquei que ele é um bebê que operou o coração e que eu estou hipertensa e comecei a ficar ruim desde ontem.
Me deram os remédios restantes e disseram que eu ficaria com sono.
Sono? Dormi o resto do dia. Ainda bem que o Felipe veio. Não vi mais nada. A pressão ficou em torno de 10x6 depois da medicação. Antes estava 15x8 quando cheguei na triagem.
Agora já entendi que preciso me cuidar de verdade.