quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Colaterais

De repente o Dário começou a chorar demais. Chorava, suava e se contorcia sem parar. Estava sentindo dor, com certeza. Mas em que parte do corpo?
E isso foi bem na hora que as cardiologistas estavam passando. Do corredor elas ouviram o choro dele e entraram no quarto.
É horrível quando ele começa a chorar e tem alguma mulher mais idosa por perto. Quase sempre ela vai começar a falar que é fome, cólica, sono ou frio. Sempre começam a falar sem parar.
Na verdade isso sempre me irritou até ontem. Ele começou a chorar demais e as duas cardiologistas começaram a falar um monte de nome de remédios. Fiquei me sentindo pior que com as mulheres idosas. Bem pior.
Então vieram com um tal de hidrato e ele dormiu. Mas e a dor? Comecei a achar que deveria levar ele embora daqui.
Ninguém descobriu exatamente por que ele começou a recusar as mamadeiras. Só passaram a sonda e ficou por isso mesmo.
Mas agora ele está tendo problemas com a sonda. Vomitou duas vezes após receber o leite, depois começou com esse choro também após o leite.
Comecei a pensar um monte de coisas. É inevitável não pensar que ele estava bem em casa até vir para cá. Eu sou só uma ignorante assistindo tudo isso e ficando desesperada.
Precisava que conversassem melhor comigo, pelo menos para tentar me acalmar um pouco.
Vão fazer o menino dormir e ponto? Se é só para sedar eu levo para casa. Não é possível!
Mas daí pensei que eles deviam estar fazendo algo, investigando, analisando, estudando. Queriam me dizer só após ter certeza. Eu preciso confiar em alguém, estou ficando louca.
Nos mandaram para fazer o eco do coração. Eu já estava super assutada com tudo. Quando cheguei lá falei que não queria que o exame fosse feito pela residente. E não foi. Ela ficou me olhando falando que tinha que começar o exame e eu insistindo que ela não ia fazer. Ela saiu e voltou com a médica. O exame foi feito e o blalock continua obstruído mesmo.
Por que a saturação está melhor então? Ela viu uns colaterais. Ela me explicou que são umas veias se  expandindo e trabalhando como se fossem blalocks naturais. Fiquei curiosa. Antes isso tivesse acontecido antes.
Pediram exames de sangue e de urina para descartar infecção. Mas ontem teve um problema no laboratório e não puderam coletar o sangue logo. Trocaram o sistema e o novo não estava funcionando. Eu não acreditei nisso, queria tanto que fizessem os exames logo para resolver tudo a tempo de operar o lábio.
Voltamos para o quarto e eu fiquei me desdobrando em 10 para correr até o lactário e ordenhar todas as mamadas dele. Vai que é porque ele ainda toma alfaré duas vezes ao dia? Vou tirar meu leite então.
Ficava sempre preocupada de deixar o quarto e vir algum médico querendo conversar comigo. Mas deu tudo certo.
A fono da equipe da Vera Cardim veio. Adorei ela. Conversou bastante comigo sobre a cirurgia e tal.
E o exame de sangue nada. Ficou para hoje mesmo mas sem previsão de quando vão conseguir liberar o resultado por causa do problema com o sistema. Sempre os sistemas.
Colocaram o leite da sonda para correr em uma hora e meia. Uma vida e meia. Não acaba nunca e a gente no quarto esperando terminar para poder sair um pouco até o corredor, que é o que pode. Só até o corredor.
A cada 3 horas chega uma sonda de leite que corre em uma hora e meia. Eu fico do lado observando se ele não vai sentir dor de novo. E foi assim. Mais duas vezes ele sentiu dor. Chorou, chorou e chorou. A última foi hoje às 4 e pouco da manhã. Isso me fez pedir para não vir a sonda das 6. De jeito nenhum, o menino fica como se fosse morrer de dor. Quero um gasto pediatra para analisa-lo.
Mas não tem no hospital. Não tem mesmo? Deu vontade de tirar o Dário daqui e levar embora. Vão sedar de novo em vez de avaliar a parte gástrica? Não tinha que fazer um exame mais específico?
Nessa altura eu já tinha falado pelos cotovelos até não poder mais. Me deixaram no escuro com uma bomba no colo. Ele está prestes a explodir de dor a qualquer momento. Não há o que o faça parar de chorar. As enfermeiras chegam com dipirona, tylenol, lufital e o diabo a quatro e nada. O que eu devo pensar?
Sério, estava ficando desesperada. Vieram com um tal de neozine para ele ficar calminho.
Mas e a dor? Será que não tem coerência o que estou pensando? Acharam mesmo que eu não iria pensar nada? Vou ficar aqui de boa, como se nada estivesse acontecendo?
Eu só conseguia pensar que ele estava com refluxo. Oculto ou não, porque tinha saído leite já. Por que não dão um remédio para refluxo em vez de sedar?
É claro que eu iria ficar remoendo tudo isso. Tinham que ter conversado comigo. Não é só confiar, é entender o que está acontecendo. Não é pedir autorização para medicar, é entender porque estão usando tal e tal remédio.
Não dormi de novo. Fiquei nessa angústia. De manhã entrou o cirurgião do lábio entrou no quarto e disse que a cardiologista tinha cancelado a cirurgia. Me senti tão abandonada. Por que eu tenho que ficar sabendo de toda conduta cardiológica dessa forma?
Falei, falei e falei um monte. As únicas coisas que posso fazer é tirar leite e falar.
Depois veio a cardiologista.
"Você tem que confiar na gente, se você não confia troca de equipe."
"A gente não sabe só sedar seu filho, acontece que ele não pode chorar do jeito que estava chorando"
"A gente não acha que tudo é coração, mas a gente tem que investigar."
Bla bla bla bla bla
Ela ficou muito tempo falando sem parar. Então alguém falou para ela tudo o que falei de ontem para hoje. E eu falei mesmo, estava desesperada. Será que ela tinha que ter ficado tão brava assim? Que estressada ela. Será que ela está mais atordoada que eu por causa do Dário? Porque ela falou que tem coisas acontecendo que eles não entendem.
Quem garante que os colaterais já não estavam lá?
Não é uma ciência exata, essa incerteza e imprecisão enlouquecem.
Eu tenho que entender o lado dela agora e ela não pode entender o meu?
Fiquei chorando, chorando e chorando. Ela foi amolecendo e me explicou dos remédios, da alteração da dieta, das linhas de investigação, de tudo.
"Nós estamos cuidando do seu filho, estamos preocupados com ele."
Se ela tivesse me dito isso ontem muita coisa teria sido evitada. Eu estou há mais de um mês presa aqui, ficando louca vendo esse menino sofrer.
A cardiologista saiu falando que iria enviar uma psicóloga para conversar comigo.
Ele não sorri desde ontem. Quando está acordado fica só olhando tudo. Percebe tudo e não sorri.


2 comentários:

  1. Oi Bruna, imagino q tudo isso seja muito desgastante pra vcs dois, vcs estão cansados um mês é muita coisa mesmo conversar com a psicologa vai ser muito bom. ( hoje ele realmente tá chateado tadinho) bjos pra vcs

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  2. Oi Bruna,

    Muita força para você nesse momento. Tenha fé que esse momento vai passar e logo logo tudo estará bem. Aprendi que devemos rezar pelos médicos que cuidam da gente também, já que eles são mortais como nós e também passam por problemas. As vezes a resposta està na frente deles e eles podem não estar enxergando. Acho que vai te ajudar muito poder conversar com alguém. O Dário é um menino forte e já já estará distribuindo lindos sorrisos de novo.
    Fiquem com Deus.
    Beijo grande, Patricia.

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